UM DESESPERADO ASSUMIDO

O evangelho segundo escreveu Marcos nos revela um episódio único na vida terrena de Jesus.
O Senhor se depara com um homem acometido de uma enfermidade infamante e humilhante para uma pessoa de origem judaica.
O fato se deu assim...
O Mestre estava nas regiões da Galiléia, precisamente nas imediações de Cafarnaum.
Quem conhece um pouco a geografia de palestina sabe que nos arredores do Mar da Galiléia ou Lago de Tiberíades, existem várias planícies de onde se pode ter visão ampla de todas as dimensões do grande lago.
Naquele momento Jesus estava no alto de uma dessas planícies instruindo uma grande multidão que sentados ouviam as suas palavras. Eu entendo que estavam presentes muitas pessoas carentes, necessitadas e muitos enfermos. Todos esperando receber uma benção da parte do Mestre.
Mas em meio aquela multidão, alguém se destaca no auge do desespero, porquanto era lastimável a vida que estava levando, o mesmo não suportou esperar como os outros, já que precisava urgentemente de auxilio.
O tal homem era literalmente agredido por uma doença chamada lepra. Esta enfermidade era uma das mais terríveis de sua época, principalmente para ele, judeu de nascimento.
A lepra, segundo a Dermatologia, é uma Infecção crônica, contagiosa, que produz lesões na pele, mucosas e nervos periféricos, se deve a uma micro-bactéria, que foi descoberta e descrita, em 1874, por Gerhard Armauer Hansen (1841-1912), médico norueguês. No meio científico tem o sinônimo de morféia, lazeira ou (hanseníase), este último em homenagem ao o médico que identificou a bactéria causadora desta doença maligna de pele.
A hanseníase para os Judeus era um mal terrível e desprezível, pois todo judeu acometido desta doença tinha que cumprir todas as leis mosaicas acerca da praga da lepra; leis que não eram nada agradáveis para o enfermo. O mesmo era obrigado a passar por uma bateria de exames, e, caso fosse constatado pelo sacerdote a existência da enfermidade, o homem deveria rasgar as suas roupas, seus cabelos deveriam ficar soltos, cobrir o bigode e sair gritando por onde andasse “imundo! Imundo!” para que todos, ouvindo o grito de sua voz, pudessem sair do seu caminho para não se contaminar, já que o judeu, segundo a lei, não poderia tocar ou ser tocado por coisas imundas. O leproso, além dessas regras, deveria habitar sozinho, fora do arraial ou da cidade.
Eu fico a imaginar o sofrimento daquele homem. O abandono, o desprezo, a tristeza e a imposição do pessimismo eram uma freqüente em sua vida. Ao observar o texto podemos chegar a uma frase “Se quiseres” (Mc 1.40; Mt 8.2; Lc 5.12) que nos revela muitas coisas. Uma dessas coisas é a passividade, já que o mesmo vivia em uma mesmice a muitos anos. Aquele leproso vivia na inércia; não atuava mais como um necessitado, como um desprovido ou carente, pois tal sentimento impregnava o seu coração e mente dizendo que o seu destino já estava desenhado nas telas da vida e, quebrar essa barreira era uma luta muito grande que tal leproso enfrentava. Não era fácil para aquele leproso enfrentar o exílio e expor-se a multidão, que por sua vez iriam lhe questionar, lhe condenar ou até mesmo tentar lhe apedrejar por quebrar as regras do exílio. O leproso sabia que era necessário agir daquela forma para alcançar seu objetivo, então se aventurou não importando as implicações que viriam sobre si.
O homem, desprovido de qualquer apoio ou méritos inicia uma campanha diante de Jesus, isso é observado na expressão “rogando-lhe!” derivado do verbo “rogar” quem tem o sentido de: Pedir com instância, instar com rogos, fazer súplicas.
Diante desse fato e do significado dele eu entendo que o desesperado literalmente fez uma oração de súplicas ao próprio Deus, dizendo: “se quiseres, bem podes limpar-me”. Em síntese, o homem estava dizendo que Jesus podia fazer qualquer coisa que quisesse, bastava apenas querer. Tal oração influenciou a compaixão do mestre, que disse: “quero, sê limpo”. O Senhor comoveu-se, não por causa da difícil situação social daquele homem ou por causa da doença lastimável que o acometia, nem ainda pelas atitudes discriminatórias de seus patrícios, mas sim por sua maneira humilde e abnegada de dizer “se quiseres”. Aquela era uma atitude singular nos dias de Jesus, e ainda o é em nossos dias , porquanto muitos chegam diante de Deus e, como se Ele fosse um empregado, dizem: “eu exijo, eu não aceito esta situação, eu determino, eu rejeito esta prova pela qual estou passando” ou coisaS do gênero. Não é assim que funciona a coisa diante de Deus. O Senhor não se deixa levar por imposições ou por determinações ensinadas a partir da “confissão positiva”.
A humildade deveria sempre ser uma das formas de nos aproximarmos de Deus, uma vez que indica reconhecimento de fraqueza, além de respeito, reverência e submissão. O leproso também se mostrou abnegado, pois renunciou à sua vontade de ser curado, depositando toda a sua vida nas mãos de Jesus.
Todos deveríamos aprender com o leproso, vivendo uma vida abnegada, seja qual for as circunstâncias que nos cerquem.
Não deveríamos nos esconder detrás de uma casca, encobrindo as nossas verdadeiras identidades.
Em muitos momentos atuamos como se fossemos atores de uma novela chamada vida. Seria melhor que cada um reconhecesse a sua fragilidade e carência, assim como fez aquele leproso.
O Senhor Jesus não veio interagir com super homens ou contracenar com um bando de atores, e sim participar da vida real dos seres humanos, conhecendo todas as suas mazelas e discrepâncias quotidianas. Jesus só conheceu o leproso porque andava pelas ruas e campos, vendo então um homem que não escondia a sua situação mortificante e ofensiva .
Muitos estão pelas ruas e precisam buscar pelo Mestre, mas precisam buscá-lo de forma abnegada e humilde para obterem o favor do Senhor. Não precisamos andar pelas sombras, para esconder dos outros o estado degradante em que nos encontramos. Muitos deveriam se apresentar sem máscaras ou maquiagens, mostrando quem são realmente. A hipocrisia não deve ser a roupagem do servo de Deus ou do carente, mas sim a transparência de vida e de caráter.
Que Deus nos ajude a viver como aquele leproso.


ex toto corde.

Nenhum comentário: